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MST Informa - nº 22 - 13/9/2002

Ano II - nº 22

sexta-feira, 13 de setembro de 2002

Todo dia é dia de terror

Dioclécio Luz*

Em 11 de setembro a imprensa abriu espaço para o que aconteceu há um ano, quando um atentado terrorista derrubou as duas torres do World Trade Center (WTC) em Nova York, nos Estados Unidos. Como é do feitio da grande imprensa foi exibido apenas a parte da questão que interessa aos Estados Unidos.

A imprensa não se aprofunda nas razões que levariam alguém ou um grupo a praticar tal ato. Não escuta o que disse a cantora Madona: "precisamos pensar, verificar onde erramos e descobrir porque somos tão odiados no mundo inteiro". Ela é apenas uma voz do contra. Há milhares de outras pessoas questionando a política belicista, sanguinária e imperialista, imposta pelos Estados Unidos ao planeta. Se estas vozes aparecessem nos grandes veículos fariam com que o mundo soubesse a verdade: os Estados Unidos usam estratégia nazista para dominar o mundo.

O correspondente brasileiro nos Estados Unidos, como tantos outros, está alegre porque tem acesso as notícias na fonte, isto é, no Departamento de Estado norte-americano. Há um ano este repórter virou menino-de-recados de Washington; há um ano ele tenta justificar a agressão dos Estados Unidos ao Afeganistão.

No mesmo tom (pastel) anuncia agora que os Estados Unidos pretendem fazer guerra contra o Iraque. Não existe um motivo, mas vão fazer a guerra porque precisam derrubar Sadam Husseim, botar um governante manipulado por eles e tomar posse do petróleo na região. Mas o repórter não diz que isto é mais um ato de terrorismo dos Estados Unidos, que será mais uma matança, mais uma agressão a um povo soberano.

A pergunta é: os repórteres da grande imprensa, de um modo geral, sabem ou não que são parceiros de um estado assassino e terrorista como os Estados Unidos? Eles não sabem que os Estados Unidos se constituem na única nação do planeta condenada por um tribunal da ONU pela prática de terrorismo no mundo? Que, por conta de uma prática histórica de invasão a outras nações e de apoio ao terrorismo explícito, os Estados Unidos se recusam a assinar uma norma da ONU que pune o terrorismo?

O que se quer aqui é mostrar que esse poder se construiu e continua sendo construído à custa de sangue, suor e lágrimas de gente em todos os recantos do planeta. Aqui se fala dos Estados Unidos que já invadiu Cuba, Colômbia, República Dominicana, Vietnã, Coréia do Sul, Nicarágua, Panamá, Haiti, Iraque, Afeganistão, Iugoslávia. Um país que patrocinou a implantação de ditaduras no Brasil, Peru, Chile, Paraguai, Argentina, Iraque; que financiou ações terroristas em El Salvador, Guatemala, Haiti, Sudão.

Os ianques chegaram na América Latina e Caribe!

Aqui se encontram as bases militares de Aruba-Curaçao (antilhas holandesas), Comalapsa (El Salvador) e Manta (Equador), esta permite vigiar toda região andina. Há também a ilha de Viesques, a sudeste de Porto Rico, onde os ianques testam seus novos armamentos. Há ainda uma base em território cubano, Guantánamo, para onde são levados e torturados os prisioneiros de guerra norte-americanos. Há bases em Honduras e Barbados. Os Estados Unidos estão presentes na Colômbia, com dinheiro e armas.

De acordo com Juan Carlos Galindo, os Estados Unidos aproveitaram-se do ataque às duas torres para praticar mais terrorismo. A presença militar norte-americana aumentou em 20% depois do 11 de setembro. São 300 mil soldados presentes em 140 países velando pelo império norte-americano.

Até meados de 2002, os EUA tinham base em Uzbequistão, 2 mil soldados; Tadjiquistão e Kirguizistão, 3 mil; Afeganistão, 5 mil. No Golfo Pérsico, com o apoio das monarquias déspotas do lugar, mantém 20 mil soldados, sendo mais de 1 mil entre Oman, Emirados Árabes e Qatar; outros 1 mil em Bahrein, onde fica o Estado Maior da quinta frota; mais 4.800 no Kuwait. Na Arábia Saudita os Estados Unidos têm três bases militares e mais de 5 mil soldados. Na Turquia existem 2 mil marines para sustentar a guerra contra o Iraque.

E não acabou.

Os antigos habitantes de uma pequena ilha no Oceano Índico, Diego Garcia, propriedade do velho império britânico, foram expulsos em 1971 para que nela se instalasse uma super-base militar norte-americana com 4 mil soldados.

Há bases até em países considerados soberanos, como Espanha (Móroin y Rota), Itália (Aviano), Alemanha. Há tropas norte-americanas na Grécia, Hungria, Islândia, Dinamarca, Noruega, Holanda, Luxemburgo, Portugal, Albânia (desde a guerra do Kosovo). Com o crescimento do poder chinês, os Estados Unidos ampliaram a presença no pacífico. Os Estados Unidos mantém 37 mil soldados e 100 aviões de combate de última geração na Coréia do Sul e mais 50 mil homens no Japão, sobretudo na base de Okinawa. 600 soldados foram despachados para as Filipinas e mais 200 soldados entre o Yemen e Geórgia.

Junte-se a esta presença física planetária ostensiva, o incrível arsenal tecnológico espalhado nos céus, incluindo satélites espiões e internet.

Onde estava a grande imprensa quando, em agosto de 1998, os Estados Unidos bombardearam uma fábrica de medicamentos no Sudão, deixando milhares de pessoas sem o tratamento e levando milhares de crianças à morte? Matar lá fora pode, né?

A partir de 11 de setembro, o novo inimigo se tornou o terrorismo internacional. George Bush afirmou que os EUA são o Bem e quem não estiver com ele é o Mal. Quando o WTC ruiu, a reação norte-americana foi a clássica - vingança contra o inimigo. E a imprensa aplaudiu. Até hoje não se provou que Bin Laden foi o culpado, mas a imprensa se satisfez com mais um trecho de vídeo "obtido secretamente", onde se demonstra uma possível relação entre o "multimilionário saudita" (é assim que a grande imprensa trata Bin Laden) e o ataque ao WTC. O vídeo veio com cortes, censurado pelo Departamento de Estado norte-americano, mas o repórter está feliz porque conseguiu sons e imagens para sua matéria.

Está feliz também por cobrir uma guerra longe de casa. Nem leva em conta que toda guerra dos Estados Unidos, desde 1945, é feita covardemente contra nações pobres e miseráveis, e bem longe de casa. O repórter ainda fica feliz por estar do lado que vai ganhar a guerra. É uma guerra contra o Terceiro Mundo de onde ele veio e tem vergonha. É evidente que o repórter vai ficar do lado moderno, o que mata com armas inteligentes, fundamentalistas. Este jornalismo chora pelos heróis do World Trade Center e sente a mesma ira dos norte-americanos contra aqueles que ousaram enfrentar o império. E jamais se pergunta por que o mundo inteiro sente tanto ódio dos Estados Unidos...

* Dioclécio Luz é jornalista, assessor do PT na Câmara dos deputados.

Breves

Prefeito e pistoleiros atiram contra acampamento em São Paulo

Em 7 de setembro, cerca de 400 famílias ocuparam a Fazenda Santa Fé, em Sandovalina, no Pontal do Paranapanema/SP, sob clima de tensão, já que pistoleiros e até o prefeito dispararam contra os trabalhadores. Em 9 de setembro, a cena se repetiu: Prefeito e cinco capangas dispararam contra os barracos, destruindo utensílios domésticos e os próprios barracos de lona, além da câmera filmadora da TV fronteira, que estava no local.

Atualmente existem cerca de mil famílias acampadas na região aguardando o assentamento, que não é feito por conta da morosidade e descaso do governo com as questões sociais. O Governo do Estado, em convênio com o Incra, tem disponível 29 milhões de reais para serem utilizados até o final do ano em arrecadação de terras públicas na região do Pontal do Paranapanema. Inconformadas com a hipótese da obrigatoriedade da devolução dos recursos para o governo federal caso não sejam utilizados, as famílias de trabalhadores sem terra se viram obrigadas a ocupar a área no intuito de lutarem pela desapropriação de terras a serem destinadas ao assentamento.

Acampados continuam resistindo a despejo em Sergipe

As cerca de 40 famílias do Acampamento São João, em Itaporanga D'Ajuda (SE), continuam resistindo à ordem de despejo em andamento. Os acampados vão permanecer na área até que seja disponibilizado um local para o assentamento deles. Os sem terra estão no local há cerca de três anos. O Incra alegou que a área não poderia ser desapropriada nem adquirida pelo Estado por questões legais. No entanto, recentemente a fazenda foi comprada pelo grupo Sales.

Em negociação com o Incra ficou acertado que os trabalhadores rurais sem terra indicariam algumas outras áreas na região para vistoria. O fato aconteceu há quase um ano. Até hoje o Incra não tomou nenhuma providência. Também em reunião com a Ouvidoria Nacional do Incra, ocorrida semana passada em Aracaju, ficou acertado que seria dado mais um prazo para negociação e busca de soluções para as áreas com ordem de despejo.

Marcha contra a Alca

Em 17 de setembro, em Brasília, aproximadamente 3 mil pessoas, entre elas, integrantes dos comitês organizadores do Plebiscito Nacional sobre a Alca realizarão uma grande marcha. Os manifestantes farão a entrega do resultado oficial do Plebiscito aos três poderes da República.

A manifestação sairá da Expo Brasília, no Parque da Cidade, às 14h. Uma marcha com 700 trabalhadores do MST, vinda do acampamento Pipiripau, em Formosa (GO), a 54 quilômetros de Brasília, irá encontrar-se com a manifestação em frente à Catedral, às 14h30. Estão previstas audiências públicas com os presidentes do Senado, Câmara, Supremo Tribunal Federal e Presidência da República até o final do dia 17 para entrega do resultado. Já foi confirmado para às 18 horas um encontro com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio. Às 21 horas, no Expo-Brasília, será realizado o Show Contra a Alca com a participação da cantora Beth Carvalho e o Grupo Clube do Choro, entre outros artistas.

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