lider pataxo protesta e denuncia >> Leia, aqui, o discurso do índio pataxó na "missa dos 500 anos". >> >> >> Publicado em: >> Jornal Folha de São Paulo, quinta-feira, 27 de abril de 2000 >> >> >> >> MISSA >> Vaticano orientou CNBB para ter comemoração menos politizada >> Índio invade celebração e protesta contra violência >> Antonio Alberghini/"A Tarde" >> O pataxó Jerry Adriani Santos de Jesus, 24, faz discurso de protesto >> na missa dos 500 anos >> >> >> ARMANDO ANTENORE >> PATRICIA ZORZAN >> enviados especiais a Porto Seguro >> >> LUIZ FRANCISCO >> da Agência Folha, em Porto Seguro >> >> >> Contrariando orientação do Vaticano para a realização de uma >> cerimônia menos politizada, a Missa dos 500 Anos de Evangelização >> foi invadida de surpresa ontem por um grupo de cerca de 40 índios que >> protestou por atos de violência cometidos contra seus povos. >> "Quinhentos anos de sofrimento, de massacre, de exclusão, de >> preconceito, de exploração, de extermínio de nossos parentes, >> aculturamento, estupro de nossas mulheres, devastação de nossas >> terras, de nossas matas, que nos tomaram com a invasão. >> Hoje, querem afirmar a qualquer custo a mentira, a mentira do >> Descobrimento. Estamos de luto. Até quando?", declarou o pataxó >> Jerry Adriani Santos de Jesus, 24, na missa. >> Acompanhado por índios vestidos a caráter e carregando uma faixa >> preta, Jesus, conhecido como Matalauê, chegou a ameaçar abandonar a >> missa caso a organização não permitisse sua entrada. >> "Fomos barrados pelos seguranças do vice-presidente (Marco Maciel), >> que disseram que não poderíamos entrar por falta de credenciais. >> Ora, estávamos em casa! Não precisávamos disso. Eles é que >> tinham de pedir licença para a gente", disse Matalauê. >> Um dos principais motivos do protesto foi o conflito entre índios e >> policiais no último sábado, dia do Descobrimento. Reprimida com >> bombas de efeito moral, a manifestação terminou em 141 presos e pelo >> menos 30 feridos. >> "Isso é nossa terra. Onde vocês estão pisando vocês têm que >> ter respeito porque essa terra pertence a nós. Vocês, quando >> chegaram aqui, essa terra já era nossa. O que vocês fazem com a >> gente? Impediram a nossa marcha com um pelotão de choque, tiros e >> bombas de gás. Com o nosso sangue, comemoram mais uma vez o >> Descobrimento", declarou Matalauê durante a celebração. >> O discurso causou constrangimento entre lideranças da CNBB. Segundo a >> Folha apurou, a entidade havia autorizado o protesto dos indígenas >> desde que ele não fosse realizado durante a missa. >> O conteúdo da celebração -presidida pelo cardeal e secretário de >> Estado Angelo Sodano, segundo homem na hierarquia do Vaticano- foi >> resultado de uma longa negociação com Roma. Defensora de pouca >> contundência nas questões sociais, a Igreja Católica vetou cantos >> e trechos críticos no evento. Diante das proibições, feitas pelo >> próprio cardeal, segundo apurou a Folha, o roteiro foi refeito pela >> CNBB. >> "O discurso foi uma iniciativa dos pataxós. Eles nos propuseram >> anteontem à noite uma forma de expressão contra os atos de >> violência de sábado. Aceitamos, mas os orientamos para que que >> fizessem isso antes da missa. Eles não apareceram no momento >> combinado. Depois chegaram e subiram ao altar", declarou o bispo d. >> Geraldo Lyrio Rocha, responsável pela comissão da CNBB que organizou >> o evento de ontem. >> "Foi um ato espontâneo e inesperado, mas a CNBB não viu isso como um >> ato de afronta", completou o bispo. >> A assessoria do Cimi (Conselho Indigenista Missionário) também >> afirmou não ter conhecimento sobre a manifestação dos índios. >> Muito aplaudido, inclusive por um sorridente ministro Rafael Greca >> (Turismo), Matalauê deixou o altar com os olhos cheios de lágrimas. >> Na primeira fila da platéia, o vice-presidente Marco Maciel não se >> manifestou. >> De acordo com o índio, a idéia da faixa preta partiu da irmã Silde >> Coldebela, uma das coordenadoras de liturgia da CNBB. A irmã não foi >> localizada para comentar. >> Depois da manifestação de Jesus, Coldebela chegou a afirmar que os >> índios condicionaram sua presença na missa ao direito de poder >> participar da maneira que achassem mais conveniente. >> Além do protesto indígena, também foram feitos pedidos de >> proteção para desempregados, sem-teto e sem-terra. >> >> Truculência >> Em carta aos colegas da conferência da CNBB, os bispos Franco >> Masserdotti, presidente do Cimi, d. Tomás Balduíno, presidente da >> Comissão Pastoral da Terra, e Heriberto Hermes acusaram a Polícia >> Militar baiana de ter agido de forma "truculenta". >> >> >> *** >> >> São Paulo, quinta-feira, 27 de abril de 2000 >> >> >> Leia abaixo a íntegra do discurso do índio pataxó >> da Redação >> >> "Hoje, é esse dia que podia ser um dia de alegria para todos nós. >> Vocês estão dentro da nossa casa. Estão dentro daquilo que é o >> coração do nosso povo, que é a terra, onde todos vocês estão >> pisando. Isso é nossa terra. >> Onde vocês estão pisando vocês têm que ter respeito porque essa >> terra pertence a nós. >> Vocês, quando chegaram aqui, essa terra já era nossa. O que vocês >> fazem com a gente? >> Nossos povos têm muitas histórias para contar. Nossos povos nativos >> e donos desta terra, que vivem em harmonia com a natureza: tupi, >> xavante, tapuia, caiapó, pataxó e tantos outros. >> Séculos depois, estudos comprovam a teoria, contada pelos anciões, >> de geração em geração dos povos, as verdades sábias, que >> vocês não souberam respeitar e que hoje não querem respeitar. >> São mais de 40 mil anos em que germinaram mais de 990 povos com >> culturas, com línguas diferentes, mas apenas em 500 anos esses 999 >> povos foram reduzidos a menos de 220. Mais de 6 milhões de índios >> foram reduzidos a apenas 350 mil. >> Quinhentos anos de sofrimento, de massacre, de exclusão, de >> preconceito, de exploração, de extermínio de nossos parentes, >> aculturamento, estupro de nossas mulheres, devastação de nossas >> terras, de nossas matas, que nos tomaram com a invasão. >> Hoje, querem afirmar a qualquer custo a mentira, a mentira do >> Descobrimento. >> Cravando em nossa terra uma cruz de metal, levando o nosso monumento, >> que seria a resistência dos povos indígenas. Símbolo da nossa >> resistência e do nosso povo. >> Impediram a nossa marcha com um pelotão de choque, tiros e bombas de >> gás. >> Com o nosso sangue, comemoram mais uma vez o Descobrimento. >> Com tudo isso, não vão conseguir impedir a nossa resistência. Cada >> vez somos mais numerosos. Já somos quase 6.000 organizações >> indígenas em todo o Brasil. >> Resultado dessa organização: a Marcha e a Conferência Indígena >> 2000, que reuniu mais de 150 povos; teremos resultado a médio e a >> longo prazo. >> A terra para nós é sagrada. Nela está a memória de nossos >> ancestrais dizendo que clama por justiça. Por isso exigimos a >> demarcação de nossos territórios indígenas, o respeito às >> nossas culturas e às nossas diferenças, condições para >> sustentação, educação, saúde e punição aos responsáveis >> pelas agressões aos povos indígenas. >> Estamos de luto. Até quando? >> Vocês não se envergonham dessa memória que está na nossa alma e >> no nosso coração, e vamos recontá-la por justiça, terra e >> liberdade." >> >> >> Próximo Texto: Discurso nasceu da repressão, diz líder >> *** >> >> São Paulo, quinta-feira, 27 de abril de 2000 >> >> >> REAÇÃO >> Pataxó afirma que decidiu fazer críticas ao lembrar de ação da >> polícia >> Discurso nasceu da repressão, diz líder >> dos enviados especiais >> >> e da Agência Folha >> >> >Indio invade missa comemorativa dos 500 anos do Brasil, e faz discurso. > >O índio pataxó Matalauê 24, Matalauê, disse que pensou no confronto com a PM >no último sábado >> e no assassinato do índio Galdino de Jesus quando redigiu o discurso >> lido ontem na cerimônia, em Santa Cruz Cabrália. >> Um dos líderes dos pataxós em Pau Brasil (BA), Galdino de Jesus foi >> queimado vivo por cinco estudantes de Brasília, há três anos. >> "Elaboramos um texto para mostrar a nossa indignação com o governo >> do presidente Fernando Henrique Cardoso, que nunca respeitou os direitos >> das minorias, principalmente os dos índios", disse Matalauê ontem. >> Comandados por Matalauê, apenas 10 dos 2.200 índios da reserva Coroa >> Vermelha participaram da elaboração do documento. Antes de dar forma >> ao texto, cantaram e dançaram em baixo de uma jaqueira, na madrugada. >> "Todos os índios que estavam no encontro expuseram seus problemas e a >> revolta pela humilhação que passamos no último sábado. Depois, >> elaborei o documento que foi aprovado por unanimidade", disse o índio, >> que é casado e tem um filho. >> Professor da aldeia de Coroa Vermelha, Jerry Adriani acrescentou que, >> inicialmente, os índios não queriam participar da celebração >> religiosa. >> "Foi revoltante o que aconteceu com a gente. Pensamos em boicotar a >> missa, mas, depois, chegamos à conclusão de que a nossa voz >> precisava ser ouvida." >> Cercado de sigilo, o discurso feito por Matalauê não foi apresentado >> nem para o cacique da reserva, Ailton Alves da Silva, o Carajá. >> "Não mostramos o texto para o cacique, mas tenho certeza de que ele >> concordou com o discurso", ressaltou Matalauê. >> Em sua opinião, o que mais revoltou os índios foi a decisão tomada >> pelo governo de impedir a manifestação durante a visita de Fernando >> Henrique a Porto Seguro, no último dia 22. >> "Fomos agredidos em nossa casa por policiais despreparados, que seguiram >> ordens de um governo que vê no índio apenas um personagem >> folclórico." >> Matalauê estava na linha de frente quando a PM interrompeu com bombas >> de efeito moral a passeata dos índios. "Os meus pés ficaram feridos >> por estilhaços." >> >> >> Próximo Texto: Igreja acusa PM de grampear telefones > >