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RELATÓRIO SOBRE VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS NA MANIFESTAÇÃO DE 20 DE ABRIL
by Coletivo de Observadores Legais
9:56am Mon Apr 23 '01


infelizemente essa foto não ficou boa, mas com um pouco de atenção vc consegue que é o momento do primeiro confronto de nossos escudos com os escudos da tropa

Este relatório tem por objetivo denunciar a ação policial que reprimiu de maneira brutalmente violenta a manifestação contra a implementação da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) realizada no dia 20 de abril do corrente ano. A ação policial resultou em 69 presos (muitos deles menores) e mais de 100 manifestantes feridos. Nesta ocasião a polícia cometeu uma série de atos ilegais abaixo descritos.

A manifestação se iniciou por volta das 12 horas com uma concentração em frente ao prédio da Gazeta (Avenida Paulista, 900). No local os tenentes da Polícia Militar Sidnei e Ferrara foram informados do trajeto da manifestação (Citibank, FIESP e Banco Central) e receberam, das mãos de uma equipe de negociadores, uma cópia autenticada de Carta de Informação encaminhada e protocolada pela Prefeitura de São Paulo e pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), cumprindo exigência do artigo 5o, inciso XVI, da Constituição Federal de 1988. Segue cópia anexa. Os manifestantes não pretendiam "fechar a Paulista" como afirmou a polícia, tanto que atravessaram a Avenida sempre na faixa de pedestres e mantinham-se sempre nas calçadas, ocupando às vezes, e apenas por alguns instantes, uma das faixas (a da direita) devido ao grande número de pessoas (aproximadamente duas mil). Portanto, o fluxo na Paulista não foi impedido em momento algum pelos manifestantes e sim pela própria polícia, conforme as fotos (X e Y) anexas.

O primeiro foco de tensão deu-se em frente à Fiesp, onde a polícia passou a bater nas pernas dos manifestantes para obrigá-los a voltar para a calçada e encurralá-los no vão do prédio. Os negociadores tentavam conter os soldados que continuavam a espancar gratuitamente as pessoas. Por um momento um grupo de pessoas tentou estender uma faixa em um dos cruzamentos da avenida enquanto o farol estava fechado. Foi então que um policial sem mesmo tentar conversar com os manifestantes desferiu, gratuitamente, um golpe de cassetete na cabeça de um deles (foto Z).

A passeata atravessou a rua e seguiu em direção ao Banco Central. Quase em frente ao Masp a tropa de choque alinhou-se (impedindo o fluxo de veículos na Avenida) e partiu em marcha na direção dos manifestantes, passando a atacá-los pelas costas, sem que nenhum incidente tenha se consumado. O grupo de negociadores tentou em vão conter a ação policial e acabou sofrendo ameaças físicas e de prisão por parte do próprio Tenente Sidnei, que possuía uma cópia da carta enviada às autoridades competentes.

Ao atacar os manifestantes a Tropa de Choque utilizou-se de cassetetes e bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo para dispersar a manifestação que transcorria, até então, de maneira pacífica.

Durante a ação policial em frente ao Masp, algumas pessoas foram encurraladas no vão do prédio e espancadas violentamente. Uma garota já caída no chão levou vários golpes no rosto e uma outra foi cercada por 4 policiais e golpeada várias vezes na cabeça. Ambas foram parar no hospital com ferimentos graves. A primeira delas esteve ameaçada de perder a visão. A outra foi atendida na neurocirurgia do Hospital das Clinicas porque um pedaço do capacete que usava como forma de proteção perfurou sua cabeça. (fotos A e B).

A polícia utilizou-se de bombas de gás lacrimogêneo, mirando os lançadores diretamente para os manifestantes, atingindo várias pessoas nas costas e nas pernas. Bombas de efeito moral foram lançadas no meio de manifestantes e explodiram muito perto de alguns deles. Pelo menos 3 pessoas tiveram estilhaços cravados nas pernas e nas mãos e foram levadas, gravemente feridas, para um hospital da região. Um deles corre o risco de perder um dos dedos. Bombas de efeito moral não podem ser lançadas contra aglomerações porque liberam estilhaços na explosão. A polícia disparou balas de borracha à queima roupa, desrespeitando a distância mínima permitida para que o disparo não cause ferimentos graves. Um dos manifestantes foi atingido no peito e a bala alojou-se próximo ao coração. Um outro manifestante foi atingido na perna por um policial com uma arma de fogo convencional. A polícia utilizou de maneira indevida e ilegal o arsenal destinado a dispersão de multidões e causou com isso um grande número de feridos.

As primeiras pessoas feridas foram encaminhadas para o Hospital 9 de Julho, na região da Paulista. Alguns foram atendidos, porém em um dado momento o hospital recusou-se a receber mais feridos (inclusive alguns com suspeitas de fraturas). Enquanto as pessoas pediam por atendimento na porta do hospital chegaram duas viaturas policiais. Os policiais sacaram metralhadoras e escopetas, apontaram para o peito dos feridos e aos berros mandaram que fossem embora. Chegaram até mesmo a atirar para o alto. A polícia abusou do poder a ela conferido e impediu que pessoas feridas recebessem atendimento.

Após o primeiro ataque da Tropa de Choque em frente ao Masp, a passeata seguiu até o prédio do Banco Central, onde algumas pessoas ocuparam o hall externo com faixas, batucada e fantasias. Nesse momento, novamente a via estava livre para o trânsito de veículos, sendo posteriormente fechada pela Tropa de Choque, que voltou a bloquear a avenida. Novamente os policiais atacaram os manifestantes com bombas de gás lacrimogêneo - muitas estavam com o prazo de validade vencido (foto H). Um grupo de 200 manifestantes que estava sentado pacificamente em frente ao Banco Central foi atacado duramente pela polícia com chutes e golpes de cassetetes. De longe, alguns policiais lançavam bombas no meio dos manifestantes. Quando alguns deles tentaram fugir e se desvencilhar dos golpes, cerca de 20 soldados formaram um Corredor Polonês (formação em que duas linhas se emparelham e as pessoas que passam entre elas são agredidas) Várias pessoas, dentre as quais garotas e menores, foram espancadas enquanto tentavam fugir.

As prisões (total de 69) se deram de maneira igualmente brutal. Muitos manifestantes, já imobilizados, continuavam a receber golpes de cassetete nas costas e nas pernas. Durante a condução dos presos do camburão até a delegacia, os detidos sofriam os mesmos golpes, além de serem ofendidos, humilhados e ameaçados verbalmente. No 78o. DP, onde estavam detidas 48 pessoas, entre elas 35 menores e a maioria mulheres, os policiais obrigaram os presos a ficarem de joelhos, virados para a parede e aplicavam-lhes uma grande quantidade de golpes, principalmente na cabeça e nas costas. Esses espancamentos foram testemunhados por um advogado e um jornalista. Um dos presos, acusado de ser o "líder" do protesto, foi o que mais sofreu nas dependências do 78o. DP.

Em suma, a polícia negou-se a negociar com os manifestantes, ignorou o fato de que a manifestação tinha sido devidamente informada às autoridades competentes, partiu para uma ação repressiva sem que tenha havido motivos concretos, utilizou de forma indevida e ilegal o seu arsenal que tem como finalidade dispersar e não machucar os manifestantes, agrediu brutalmente e de maneira covarde, com requintes de crueldade pessoas acuadas, sentadas e por vezes até mesmo deitadas e imobilizadas, impediu o fluxo da Avenida Paulista que dá acesso a um grande número de hospitais, torturou presos em dependências de delegacia e impediu que cidadãos feridos fossem atendidos em um hospital. E para garantir sua impunidade omitiram seus nomes e agiram sem suas identificações.

Plícia alegou dois motivos para tamanha repressão: 1. o fato da manifestação ser ilegal por falta de comunicação (o que está comprovado como mentira pela carta de notificação anteriormente mencionada) e 2. a ausência de líderes fazia com que não tivesse com quem negociar. Com relação à segunda afirmação, havia uma equipe especialmente destinada a negociar com a polícia e evitar que as leis que limitam a ação policial fossem desrespeitadas. Essa equipe identificou os comandantes e responsáveis pela ação policial, comunicou a existência da Carta de Informação e a todo o momento procurou a polícia tentando compreender quais eram suas exigências procedendo à sua comunicação aos manifestantes que as cumpriam prontamente.

Ao contrário do que declara, foi a própria polícia que se negou a negociar - expulsando e ameaçando os negociadores como já foi aqui relatado - partindo diretamente para a agressão e desrespeitando as leis da Constituição Federal e violando os Direitos Humanos.


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